05/01/2010

A Guerra Peninsular na Literatura

27 de JANEIRO de 2010
(4ª feira)
21h00



Ao lermos El-Rei Junot tem-se a impressão de estar diante de uma água-forte sombria onde o dramático e o grotesco são notas dominantes. Uma obra que oscila entre a epopeia e a farsa trágica, ou antes: uma epopeia que não chega a sê-lo, sempre gorada pela intromissão do grotesco e do mesquinho. A visão que o autor tem da época em que se situa o seu livro, das personagens, dos cenários, dos actos e das intenções é, pode dizer-se, uma verdadeira «análise espectral»: a decomposição desmistificada, antiromântica e anticonvencional do passado. Como que uma unha raspando a camada de verniz que pretendeu tornar brilhante e vistoso um cerne de má qualidade e apodrecido pelo tempo. Um prolongamento da sua visão pessimista e desenganada da humanidade incidindo sobre um determinado momento histórico do espaço português.


Na raiz desta visão pessimista da época em causa subjaz o inato pender negativista de Raul Brandão para encarar a vida e as opções humanas em termos de drama ou de tragédia. Sobre o autor do Húmus talvez se possa dizer, transferindo-o do plano biográfico ao plano literário, o que ele próprio afirmou de Camilo: «Onde o grande escritor põe a mão é tragédia certa». Também, como Camilo, Raul Brandão «só fala de desgraças», quer dizer, só lhe interessa o lado trágico ou dramático da vida. Mas aqui, nesta obra, o drama e tragédia são como que neutralizados pela pequenez, pela inferioridade, pela mesquinhes do ambiente em que se processam e, consequentemente, o drama transforma-se por vezes em comédia e a tragédia em farsa. Da comédia dramática ou de farsa trágica se poderá, por isso, sem grande arrojo de nomenclatura, rotular esta obra de Raul Brandão.

Dinamização: Joaquim Moedas Duarte e Pedro Fiéis

LOCAL: Biblioteca Municipal de Torres Vedras
DURAÇÃO: 2 horas
PÚBLICO-ALVO: Adultos
INSCRIÇÕES/ CONTACTOS: Biblioteca Municipal de Torres Vedras
tel. 261310457
biblioteca@cm-tvedras.pt

1 comentário:

Joaquim Moedas Duarte disse...

Esta é uma apreciação possível...

Raul Brandão está um pouco esquecido mas podemos dizer que ele é um existencialista avant la lettre, isto é, olhou o passado e o presente com uma perspectiva desencantada mas de um enorme humanismo, de uma tocante compaixão para com a natureza humana, a braços com a morte de Deus e à procura de um outro Deus. A sua visão do mundo tem algo de profético e encaixa-se perfeitamente nas interrogações do homem contemporâneo...
A escolha deste livro, no contexto da evocação da Guerra Peninsular, visa, julgo eu, dar uma perspectiva de análise diferente e mais profunda do que a mera descrição hstórica em que tantas vezes caímos.